Análises de impacto orçamentário (AIO) são a etapa final de uma avaliação de tecnologia completa, sendo cada vez mais frequentemente solicitadas em dossiês para incorporação de tecnologias, tanto no setor público como privado. Diferentemente da análise de custo-efetividade, onde os valores são apresentados em nível individual, a AIO mostra o gasto total de um sistema de saúde com a adoção de determinada tecnologia, levando em conta, entre outras variáveis, o tamanho da população alvo na qual será utilizada a tecnologia.
No Brasil, a diretriz para análise de impacto orçamentário no setor público foi publicada em 2012, sendo resumida em artigo do mesmo ano, do qual dois dos sócios da HTAnalyze são coautores. Esta diretriz havia utilizado como uma de suas principais fontes a publicação disponível na época da ISPOR, a qual foi atualizada há pouco mais de um ano. O objetivo deste post é revisar os principais pontos deste novo documento da ISPOR.
O primeiro passo na realização de uma AIO é a definição da estrutura analítica e de pressupostos da análise, incluindo:
- perspectiva e horizonte temporal da análise;
- detalhamento do sistema de saúde, incluindo possíveis restrições ao acesso da nova tecnologia;
- grau de utilização (incluindo tamanho da população alvo) e custos da(s) tecnologia(s) em vigência para a condição alvo;
- velocidade prevista da incorporação da nova tecnologia, e tamanho da população alvo usuária no final do período de análise;
- entendimento sobre se a nova tecnologia é substitutiva de tecnologias em uso atual, ou aditiva;
- outros possíveis impactos em custos (como, por exemplo, redução de internações decorrentes da doença por melhor controle da mesma);
- procedimentos para análise de incertezas;
- tipo de modelo que será utilizado.
Dentre os itens acima, vários possuem razoável dificuldade de predição, como a velocidade de incorporação da nova tecnologia, e o quanto do mix de tecnologias antigas a tecnologia nova irá substituir. Um exemplo seria a introdução de um novo anti-hipertensivo, o qual poderia competir com um ou vários dos tratamentos atuais, ou ser mais comumente usado como um tratamento adjuvante aos já existentes. Essas incertezas devem ser adequadamente exploradas em análises de sensibilidade.
Outra questão delicada em uma AIO é o horizonte temporal. Diferentemente de uma análise de custo-efetividade, onde a grande maioria das diretrizes sugere horizontes bastante longos, a AIO costuma ter horizontes mais curtos, usualmente entre 1 e 5 anos, pois são os períodos que costumam ser relevantes para o tomador de decisão (o qual usualmente será o detentor do orçamento por períodos de não mais de 5 anos). Porém, algumas intervenções de caráter mais preventivo podem ser duramente penalizadas por essa abordagem, por não permitir que economias futuras sejam levadas em conta na análise. Deste modo, ao menos em análise de sensibilidade, casos com importante economias futuras deveriam apresentar um cenário com horizonte temporal mais longo.
Um aspecto que é prática comum (e amplamente recomendada) em análises de custo-efetividade, porém desencorajada em AIO, é a aplicação de taxa de desconto. Na AIO, não há necessidade de trazer valores futuros para valor presente – o tomador de decisão, aqui, realmente quer saber o montante financeiro total que será gasto. Deste modo, não é recomendado utilização de taxa de desconto em AIO.
Sobre a questão de modelo, o procedimento mais comum é uma modelagem de dados simples, com utilização de tabelas eletrônicas (como MS Excel) padronizadas. Algumas situações, porém, especialmente as que analisam cenários onde há razoável dinâmica no tamanho da população, podem exigir modelagens mais complexas, com simulação de indivíduos – nestes casos, modelos computacionais em softwares específicos, como o TreeAge, podem ser a abordagem necessária.
A análise acerca de incertezas é especialmente desafiadora em uma AIO, uma vez que usualmente os parâmetros para os quais se tem incerteza, é bastante difícil quantificar a mesma, assim como estabelecer limites para análise de sensibilidade univariada e distribuições para análise probabilística. Deste modo, o mais usual é determinar outros valores plausíveis para parâmetros (ou mesmo outras abordagens estruturais no modelo) e proceder com análises de cenários alternativos.
A mesma dificuldade para estimar o tamanho da incerteza em parâmetros é seguidamente encontrada para as estimativas pontuais dos mesmos. Porém, uma revisão sobre fontes de dados para parâmetros mais comumente necessários para uma AIO foge do escopo desta postagem.
Após finalizada a AIO, é necessário que seja montado o relatório, o qual deveria descrever detalhadamente todos os pressupostos da análise, fontes de dados, mix atual de tecnologias e mix (com proporções de uso) prevista após adoção da nova tecnologia, principais incertezas e abordagem analítica. Os resultados devem ser extensamente descritos, especialmente os cenários alternativos avaliados, com utilização de gráficos e tabelas. Por fim, o relatório deve ter clareza em claramente declarar suas limitações.
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