O objetivo de revisões sistemáticas de intervenção é avaliar o seu potencial efeito causal em um ou mais desfechos. Ensaios clínicos geralmente são os estudos mais adequados para avaliar essas questões. Para avaliar a qualidade desses estudos, o instrumento mais adequado é a Cochrane Risk of Bias Tool.
Em nosso post anterior vimos algumas situações em que utilizaremos evidências de estudos observacionais para responder nossas questões em revisões sistemáticas, como, por exemplo, a ausência de ensaios clínicos adequados avaliando a questão de pesquisa proposta. A avaliação da qualidade da evidência nesses estudos sempre foi desafiadora e nunca houve um instrumento de consenso para o mesmo. O instrumento mais utilizado até então era a Newcastle-Ottawa Scale, frequentemente alvo de críticas.
Recentemente a Colaboração Cochrane propos o ACROBAT-NRSI (“A Cochrane Risk Of Bias Assessment Tool for Non-Randomized Studies”). Essa é a nova ferramenta da Cochrane para avaliação da qualidade de estudos observacionais. Se propõe a avaliar a qualidade metodológica de estudos de coorte e de caso-controle para revisões sistemáticas de intervenção. Como avalia a relação causal, pode também ser utilizada em revisões avaliando etiologia, que classicamente são respondidas utilizando delineamentos observacionais.
Em resumo, o instrumento avalia sete domínios, conforme apresentado na tabela abaixo. Os três primeiros domínios podem ser considerados como domínios pré-intervenção, específicos para estudos observacionais. Os outros quatro domínios são pós-intervenção, podendo ser também, conceitualmente, potenciais vieses em ensaios clínicos randomizados.
Para cada domínio se atribui uma das seguintes classificações em relação ao risco de viés:
- Baixo risco de viés (low risk of bias)
- Moderado risco de viés (moderate risk of bias)
- Grave risco de viés (serious risk of bias)
- Crítico risco de viés (critical risk of bias)
- Sem informação para julgamento do risco de viés (no information on which to base a judgement about risk of bias)
Para cada um desses sete domínios, o instrumento apresenta questões específicas para auxiliar no julgamento do risco de viés. Há um conjunto de questões específicas para estudos de coorte e outro conjunto para estudos de caso-controle. Abaixo vemos a parte do instrumento referente ao domínio seleção dos participantes, para estudos de coorte.
O risco geral de viés de cada estudo é o risco atribuído ao domínio com maior risco de viés, como podemos observar na tabela abaixo.
Em nossa opinião a ferramenta da Cochrane é bastante robusta e abrangente, contudo adiciona um nível de complexidade muito maior frente aos instrumentos anteriores. Reforça a necessidade dos pesquisadores aprimorarem seus conhecimentos em métodos para realizarem revisões com boa qualidade.
Outro ponto bastante interessante é que aproxima os estudos observacionais dos ensaios clínicos randomizados. Como vimos, entre os domínios considerados pelo ACROBAT-NRSI, vários são aplicáveis também a ensaios clínicos. É uma tendência interessante que os estudos não sejam mais classificados como randomizados ou não-randomizados, mas que a randomização seja um critério de qualidade adicional dentro de estudos que possam ser classificados com o enfoque de intervenção, independente do delineamento utilizado.
Por fim, se observa um alinhamento importante entre esse instrumento e o GRADE. Há uma definição mais pragmática e objetiva dos níveis de vieses, importante para o domínio limitações metodológicas (risk of bias) do GRADE. Há uma proximidade bastante grande entre a Cochrane Collaboration e o GRADE working group, assim é esperado também que o GRADE, em breve, se adapte a essas modificações na da Cochrane frente a avaliação da qualidade de estudos observacionais.
O instrumento e seu manual podem ser consultados nesse site. Sugerimos sua leitura.
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