Meta-regressão

Meta-regressão consiste em uma forma de análise de sensibilidade em metanálises. Permite avaliar o impacto de covariáveis no resultado metanalisado, através de técnicas de regressão.

Por vezes nos deparamos com heterogeneidade ao metanalisar dados em nossas revisões sistemáticas. Isso implica em duas ações: incorporar a heterogeneidade no modelo e, por fim, explicá-la.

Incorporar a heterogeneidade é uma etapa simples e consiste em utilizar modelo de efeitos aleatórios na análise. Explicar a heterogeneidade consiste em proceder com análise de sensibilidade. Há diversas formas de análise de sensibilidade, as principais são:

  • Exclusão de outliers: consiste em retirar da análise estudos distoantes, responsáveis pela heterogeneidade observada. A retirada desses estudos idealmente deve ser guiada por uma justificativa de cunho clínico ou metodológico como, por exemplo, ter avaliado uma população com características diferentes dos demais estudos ou ter utilizado diferentes critérios de avaliação para o desfecho de interesse.
  • Análise de subgrupos: consiste em dividir a amostra em dois ou mais grupos e avaliar separadamente cada um desses subgrupos. A separação desses grupos pode ser feita a partir de variáveis clínicas (por exemplo, gravidade da doença) ou metodológia (por exemplo, qualidade dos estudos). A análise de subgrupos tenta explicar a heterogeneidade a partir de variáveis categóricas.
  • Análise de meta-regressão: é semelhante à análise de regressão linear. Diferente da análise de subgrupos, se propõe a explicar a heterogeneidade a partir de variáveis contínuas como, por exemplo, a dose de um medicamento ou tempo de seguimento do estudo.

Para exemplificar o uso da meta-regressão, vamos analisar um exemplo clássico. Com o surgimento de novos casos de tuberculose nos Estados Unidos no início da década de 90, havia a necessidade de informações subsidando a recomendação ou não do uso da vacina BCG para sua prevenção. Para responder a essa questão, Colditz et al realizaram em 1994 uma revisão sistemática. Na figura abaixo temos o resultado da metanálise, utilizando modelo de efeitos fixos.

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De acordo com essa análise, há benefício com uso da vacina BCG na prevenção de tuberculose (OR 0,62; IC95% 0,57 a 0,68). Observe a inconsistência alta encontrada (92,7%); observe também o peso atribuído a cada estudo.

Precisamos, inicialmente, incorporar essa heterogeneidade no modelo, utilizando o modelo de efeitos aleatórios. O modelo de efeitos aleatórios (também chamado modelo de efeitos randômicos) considera que o efeito observado em um determinado estudo é uma estimativa de seu efeito real e que os efeitos de todos os estudos seguem uma distribuição geral. Assim, a medida sumarizada possui um intervalo de confiança mais amplo e os estudos menores ganham peso maior do que possuiam em um modelo de efeitos fixos. Observamos o resultado com o uso de modelo aleatório na figura abaixo:

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Observe que a medida sumarizada possui um intervalo de confiança mais amplo, sendo assim, um resultado mais conservador. Observe também o peso dos estudos: estudos maiores perderam peso, enquanto os estudos menores passaram a possuir uma contribuição relativa maior na medida final da metanálise. A inconsistência permanece a mesma: ela foi incorporada na análise, mas permance sem explicação.

Em 1995, Berkey et al reanalisaram esses dados, tentando explorar potenciais fontes de heterogenidade. Pouca informação havia sobre esses estudos que pudesse gerar análises, mas uma, em especial, chamou atenção dos pesquisadores: a localização dos estudos. Países mais próximos à linha do equador tendem a ser mais quentes, o que pode impactar na efetividade da vacina (em especial em campanhas de vacinação); além disso, tendem a ser menos desenvolvidos socio-economicamente. Na figura abaixo temos um forest plot, com os estudos ordenados de acordo com a latitude onde foram conduzidos.

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Pois bem, como observamos, parece que há uma associação significativa entre a latitude e efetividade da BCG, sendo menor o risco de contrair a infecção em países com maior latitude. Para avaliar essa hipótese, abaixo temos a análise de meta-regressão.

slide 4

Apresentamos aqui o chamado “Bubble plot”, que é o gráfico da meta-regressão. No eixo x temos a nossa covariável (latitude) e no eixo y temos a medida de associação de cada estudo (nesse caso, o logarítmo natural do risco relativo). Cada círculo consiste em um estudo; o tamanho do círculo é proporcional ao tamanho do estudo. Acima do gráfico, temos o resultado da meta-regressão. Observe a linha “latitude”: a estimativa pontual é -0.02923, o que corresponde a uma redução relativa do risco da ordem de 2,88% para cada grau de latitude [dado por 1-exp(-0.02923)]. O valor-p de 0.00001 nos indica que a latitude está associada, de forma estatisticamente significativa, à efetividade da vacina BCG. Nesse caso em específico, a latitude explicou 79% da heterogeneidade inicialmente observada (dado não apresentado neste post).

Algumas observações adicionais sobre análise de meta-regressão:

  • Há a possibilidade de, em uma análise de sensibilidade, converter variáveis contínuas em variáveis categóricas. Por exemplo, consideramos que uma meta-análise foi realizada com o objetivo de avaliar a efetividade da Vitamina E em desfechos clínicos. Os estudos incluídos na revisão utilizaram diferentes dosagens de Vitamina E: 100mg, 200mg, 400mg, 600mg, 800mg e 2000mg. Uma alternativa é categorizar a dose em alta e baixa, utilizando, por exemplo, 400mg como ponto de corte; contudo isso implica em perda de informação. Além disso, estaríamos classificando, por exemplo, a dosagem de 600mg como semelhante a 2000mg e diferente de 400mg, o que conceitualmente pode fazer pouco sentido; a meta-regressão evitaria tal distorção.
  • Estatisticamente, uma análise de meta-regressão pode ser realizada com três estudos. Entretanto, o recomendado é a presença de pelo menos 10 estudos para efetuar tais análises; na literatura observamos meta-regressões sendo realizadas em metanálises com cinco ou mais estudos.
  • É possível realizar meta-regressão com mais de uma variável, sendo possível também combinar variáveis contínuas e categóricas (por exemplo, adicionando no mesmo modelo gravidade da doença e dosagem da medicação). Para a execução de uma meta-regressão com múltiplas variáveis idealmente necessitaríamos de 10 estudos para cada variável adicionada no modelo; por esse motivo, tal análise é incomum nas metanálises.

Agradecemos o tempo dedicado à leitura deste post; esperamos que tenha sido útil o conhecimento adquirido. A HTANALYZE possui curso específico de análise de meta-regressão, sendo, no nosso conhecimento, o único curso específico sobre o tópico oferecido no Brasil. Informações adicionais sobre o curso estão disponíveis nesse link.

Em São Paulo, dias 27 e 28 de outubro de 2017, teremos o IV workshop de metanálise em R, que também abordará aspectos de meta-regressão. Informações sobre esse curso disponíveis nesse link.

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Publicado em Conteúdo Teórico
2 comentários sobre “Meta-regressão
  1. Elizete A disse:

    Excelente material, parabéns!

  2. Para ens pelo material. Claro, didatico,e objetivo.

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