Ensaio clínico randomizado: ainda o rei da saúde baseada em evidências

 

Texto por André De Azeredo –

Se você é pesquisador ou estudante da área da saúde, certamente conhece o conceito de hierarquia das evidências. Esse conceito se baseia na ideia de que os diferentes delineamentos de pesquisa apresentam maior ou menor capacidade de demonstrar o tamanho do efeito de intervenções na área da saúde, controlando para viés de seleção e confundidores. Por essa medida, os ensaios clínicos randomizados tradicionalmente são posicionados no topo da pirâmide, enquanto os estudos observacionais, mais suscetíveis a erros sistemáticos, ocupam as posições intermediárias da hierarquia. A base da pirâmide é ocupada por estudos com muito elevado risco de viés de seleção ou de influência de fatores de confusão, como séries de casos, relatos de casos e até mesmo opiniões de especialistas.

Entretanto, desde os início dos anos 2010, tenho observado que um outro tipo de estudo tem sido representado na posição máxima da hierarquia das evidências: a revisão sistemática da literatura. Esse tipo de estudo tem por objetivo reunir todas as evidências relevantes sobre uma questão de pesquisa bem delimitada e apresentar uma síntese “inteligível” de um volume muito grande de informações, o que frequentemente é feito por meio de uma metanálise.

As revisões sistemáticas surgiram para resolver um grande problema que a comunidade científica passou a ter com o acúmulo de numerosos estudos, muitos deles randomizados, porém com variável qualidade metodológica: elas possibilitaram interpretar o resultado de um estudo individual no contexto de toda a evidência publicada até um ponto no tempo. Dessa forma, resultados aparentemente inconsistentes de estudos sobre uma mesma questão de pesquisa passaram a ser conciliáveis, oferecendo um melhor dimensionamento do tamanho do efeito das intervenções em saúde, ao mesmo tempo em que as razões pelas quais estudos semelhantes alcançavam conclusões distintas tornavam-se evidentes e compreensíveis.

Ora, se a razão pela qual as revisões sistemáticas terem sido alçadas ao topo da pirâmide das evidências é o fato de serem, em grande parte, coleções organizadas de ensaios clínicos randomizados, em verdade os estudos randomizados seguem sendo o tipo de evidência mais robusta para demonstrar o tamanho do efeito das intervenções em saúde. Estudos randomizados originais seguem sendo necessários em muitas áreas para avaliar eficácia, efetividade, segurança e até mesmo custo-efetividade de intervenções em saúde, dessa forma alimentando as revisões sistemáticas que sintetizam e consolidam o conjunto dos estudos produzidos pela humanidade.

 

Médico internista e epidemiologista, pesquisador clínico, empreendedor, educador.

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Publicado em Artigos Publicados

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